Um dia acordas e tudo parece no seu sítio. Os objetos estão
pousados onde os deixaste, as rotinas são as de ontem e anteontem, o Mundo está
no seu eixo. Algures pelo caminho, surge a catástrofe natural: um terramoto de
informação, seguido da respetiva avalanche de sentimentos. Uns são naturais e
de se esperar: as lágrimas, a raiva, talvez algum vazio… Isso, qualquer um
adivinha que será o que lhe espera quando alguém lhe pontapeia o Mundo e tudo
vira do avesso. O que não seria de esperar é aquele sentimento de estranheza,
como se, de repente, tudo fosse desconhecido. Questionas porque pousas as
chaves em cima da mesa da cozinha, em vez de as pousares na entrada de casa.
Intrigas-te sobre a razão de só escovares o cabelo depois de lavares os dentes,
se é exatamente igual quando invertes os movimentos. Não te lembras o que te
levou a escolheres aquele sítio como o melhor para estacionar o carro. Não
sabes porque é que essas coisas só acontecem a ti (mesmo reconhecendo automaticamente
que também acontecem aos outros). Só sabes com certeza e imediatamente que
aquele minuto em que a vida mudou (e que talvez seja mais ou menos minutos,
sabe-se lá?!), alguma coisa importante quebrou. Mais ou menos como quando se
parte uma perna: 2 minutos depois, já percebemos que a dor é lancinante, vai
demorar meses a ser curada e talvez até precises de fisioterapia para
recuperares da lesão. E partir a alma é assim mesmo, com duas grandes
desvantagens: não há analgésico que nos safe nem fisioterapeuta que nos valha.
Temos de suportar tudo a sangue frio e manter o resto Mundo no seu eixo. O
Mundo não espera por recuperações! O Mundo não tem tempo para isso.
Simplesmente gira uma e outra vez, incessantemente, desde sempre. O que fazer
nessa altura? Procurar uma band-aid e rezar para que mantenha tudo no sítio? Ou
simplesmente continuar a levantar de manhã, rezando para a alma partida sare
rapidamente e o Mundo volte a girar no seu eixo novamente? Há quem diga que as mudanças são boas. Talvez tenham razão. A mim, parecem apenas dolorosas.
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